Tite e João Saldanha: o futebol brasileiro novamente “bate continência” ao autoritarismo


Marcelo Barros
10/06/2021

Karl Marx, em seu 18 Brumário de Luís Bonaparte, disse que “a história se repete: a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”. Essa frase nunca esteve tão atual para definir a chamada “crise da CBF e da Copa América no Brasil”. Hoje vemos, mais uma vez, que o futebol brasileiro e sua entidade nacional foram tomados de assalto pelo conluio entre CBF, lobbies e Governo.

O Presidente da República, mancomunado com os “seus militares”, busca intervir no comando técnico da Seleção Brasileira por causa da recusa dos jogadores convocados por Tite em jogar a Copa América no Brasil. O torneio está sendo usado por Bolsonaro para “aparecer politicamente as custas da Seleção Brasileira, dos seus jogadores e comissão técnica”, como uma “vitória política”.

Com quase 500 mil mortos nessa pandemia, com uma vacinação descoordenada, além dos esforços de combate ao Covid-19 estarem aquém daquilo que é necessário, do negacionismo científico e político feito pelo Presidente da República, a realização de uma Copa América em nosso país beira o ridículo.

Os seus defensores dizem que “isso é dor de cotovelo da Globo por não transmitir o torneio”, ou “se aqui podem ter jogos dos campeonatos de clubes, Libertadores da América e Copa Sul-americana, por que não pode fazer a Copa América?”. Toda essa narrativa que não tem nenhuma sustentação técnica, tampouco científica é usada como “cortina de fumaça” para desviar o foco da sociedade para a CPI do Senado que investiga a omissão dos entes públicos na pandemia e para esconder o fracasso econômico que o governo Bolsonaro carrega. Mais de 14 milhões de desempregados, economia parada, pobreza e miséria aumentando vertiginosamente, fome voltando as casas dos brasileiros, etc.

Outro ponto que merece uma análise mais minuciosa é o fato de a transmissão do torneio sul-americano ficar nas mãos de uma emissora comandada pelo sogro do atual ministro das comunicações. Isso é muito estranho!

E tudo nos remonta as vésperas da Copa de 1970, quando o “presidente de plantão”, General Médici, ordenou a demissão do então técnico da Seleção, João Saldanha, apenas “porque era comunista”. O final todos nós vimos. Brasil campeão nos gramados mexicanos encantando o mundo e a ditadura militar com o seu “ufanismo patriótico” dizendo “Ninguém segura este país”, “Brasil, ame ou deixe-o”, etc.

Os militares colocaram os seus coturnos no patrimônio mais conhecido do Brasil no mundo, a Seleção Brasileira.

Mas alguns podem até falar assim: “Ah, mas a Seleção sempre foi usada para fins escusos e que os dirigentes da CBF são corruptos”. Isso tem um grande quê de verdade. O atual presidente da CBF hoje é acusado de assédio sexual por uma funcionária e sofre pressão de dirigentes da própria entidade e de patrocinadores da Seleção para se afastar do cargo enquanto faz a sua defesa. Porém, se recusa a fazer isso e se joga nos braços de Bolsonaro para manter-se no comando do futebol brasileiro.

Faz muito tempo, principalmente em virtude de nossos jogadores saírem daqui precocemente, que a Seleção Brasileira é divorciada do povo brasileiro, que os seus jogadores jogam muito mais pelo status do que pelo patriotismo e amor à camisa. Chamo isso de “efeito colateral da mercantilização do futebol”. Mas é inaceitável a realização de um torneio continental de seleções no Brasil apenas para alimentar o ego de um presidente negacionista e que tem compromisso apenas com a sua vaidade e sede de poder.

O uso político do futebol e da seleção brasileira foi longe demais. Agora já estão falando que “a cabeça do técnico da seleção e de sua equipe será colocada numa bandeja para Bolsonaro” e que um técnico “leal ao governo” assumirá o nosso escrete canarinho.

São os mesmos que acusavam o PT de fazer a “maior roubalheira da história com a Copa do Mundo no Brasil” e agora usam de instrumentos escusos para zombar da cara de quase 500 mil famílias que perderam seus entes e amigos para a Covid-19.

*Marcelo Barros é Membro do Diretório Nacional do PDT

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